terça-feira, 20 de outubro de 2009

Valery disse que a prosa é a marcha e a poesia é a dança...

Gosto muito das músicas do Barão Vermelho, sobretudo, interpretadas pelo Frejat, para mim, hoje o melhor representante do Rock Nacional, dos grupos que foram surgindo a partir da década de 80. O novo mercado musical "obrigou" muitos artistas a se adaptarem para que pudessem sobreviver nesses novos tempos. Na minha opinião, alguns foram longe demais, como os Titãs e o Paulo Ricardo, mas isso é uma outra estória... Rock nacional começou lá atrás, em 1968, com uma banda chamada Raulzito e seus Panteras, de onde emergiu o grande roqueiro nacional, Raul Seixas (de quem farei um comentário especial, mas falar de Raul e não cair na mesmice precisa de muita concentração), cantor, campositor, artista.
Gosto dessa música pela forma como a voz chama a todos para ver a poesia, pelos significados que estabelece, sobretudo porque mostra como a literatura está presente em nossos dias, mesmo que não percebamos de uma forma direta, e é sobre isso que também fala a música. Quem, mesmo sem estudá-los, nunca ouviu falar de Dante Alighieri ou Miguel de Cervantes e seu Dom Quixote? Quem nunca ouviu os termos dantesco (fazendo referência à grandiosidade da Divina Comédia) e quixotesco? O poeta é aquele que enxerga as mesmas coisas que nós, mas as traduz e exprime de uma forma diferente, que toca a nossa sensibilidade. E por mais que temos a sensação de que o mundo caminha para a degradação, que as coisas antigamente eram melhores, que as pessoas estão cada vez mais individualistas, a vida nos presenteia com momentos que nos demonstram que o poeta ainda está vivo. Vamos continuar lendo os jornais, pois é inútil ignorar o cotidiano e suas obrigações, mas de vez em quando, sempre que possível, ver o sol e escutar o galo cantar... e ainda me lembro quando o galinho cantava todas as noites.

O Poeta está vivo (link com o vídeo)
Composição: Roberto Frejat e Dulce Quental

Baby, compra o jornal, e vem ver o sol.
Ele continua a brilhar, apesar de tanta barbaridade...
Baby escuta o galo cantar, a aurora dos nossos tempos.
Não é hora de chorar, amanheceu o pensamento...
O poeta está vivo, com seus moinhos de vento,
a impulsionar a grande roda da história...
Mas quem tem coragem de ouvir, amanheceu o pensamento,
que vai mudar o mundo, com seus moinhos de vento...
Se você não pode ser forte, seja pelo menos humana,
quando o Papa e seu rebanho chegar, não tenha pena...
Todo mundo é parecido, quando sente dor,
mas nu e só ao meio dia, só quem está pronto pro amor...
O poeta não morreu, foi ao inferno e voltou,
conheceu os jardins do Éden e nos contou...
Mas quem tem coragem de ouvir, amanheceu o pensamento,
que vai mudar o mundo, com seus moinhos de vento.

a. O poeta está vivo com seus moinhos de vento

- A aventura vai encaminhando os nossos negócios melhor do que soubemos desejar, porque, vês ali, amigo Sancho Pança, onde se descobrem trinta ou mais desaforados gigantes, com quem penso fazer batalha, e tirar-lhes a todos as vidas, e com cujos despojos começaremos a enriquecer; que esta é uma boa guerra e bom serviço faz a Deus quem tira tão má raça da face da terra.
- Quais gigantes? – disse Sancho Pança.
- Aqueles que ali vês – respondeu o amo -, de braços tão compridos, que alguns os têm de quase duas léguas.
- Olha bem Vossa Mercê – disse o escudeiro – que aquilo não são gigantes, são moihos de vento, e o que parecem braços, não são senão as velas, que tocadas do vento fazem trabalhar as mãos.
- Bem se vê – respondeu Dom Quixote – que não andas corrente nisso das aventuras; são gigantes, são; e, se tens medo, tira-te daí, e põe-te em oração enquanto eu vou entrar com eles em fera e desigual batalha (CERVANTES, 2002:59)

Depois de atuar por anos como soldado, Miguel de Cervantes estreia como escritor em 1585. Não foi um grande dramaturgo, tendo, contudo, imortalizado sua existência com a obra Dom Quixote, publicada em 1604. Um grande tema do livro passa pela questão da loucura, a condição de se viver em ilusão, uma vida em que a realidade não pode encontrar um lugar. Segundo o crítico Harold Bloom, Cervantes foi o maior escritor em língua espanhola, “eminência para todo o sempre, comparável a Dante, Shakespeare, Montaigne, Goethe e Tolstoi, que escrevem nos demais grandes idiomas vernáculos ocidentais”.

b. O poeta não morreu, foi ao inferno e voltou
Conheceu os jardins do Éden e nos contou


Por mim se vai das dores à morada,
Por mim se vai ao padecer eterno,
Por mim se vai à gente condenada.

Moveu justiça o autor meu sempiterno
Formado fui por divinal passança
Sabedoria suma e amor superno

No existir, ser nenhum a mim se avança
Não sendo eterno, e eu eternal perduro
Deixai, a vós, que entrais, toda a esperança!

A vida de Dante Alighieri assemelha-se a um poema atribulado, mais próximo do Inferno do que ao Purgatório criados pelo poeta, bem distinto do Paraíso. Quanto à musa, Guido Cavalcanti, também poeta, revela que “Beatriz é toda felicidade que ele teve na vida e, sem ela, não teria encontrado o caminho da salvação”. (BLOOM, 2003:122)
Dentre todos os relatos bíblicos, pode-se dizer que o mais mítico é aquele do drama do Éden, contido nos capítulos II (versículos 7-25) e III do Gênesis. O trajeto de Dante se inicia pelo Inferno, que corresponde à primeira parte da Divina Comédia. Cada círculo do Inferno correponde a um tipo de pecado, do Limbo à cidade de gelo, onde se encontra Lúcifer. As outras duas partes desenvolvem-se no Purgatório e no Paraíso, onde finalmente Dante encontra sua musa Beatriz.

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